Sentinelas da Natureza: o que a fauna pode nos contar sobre as mudanças ambientais?

A fauna silvestre atua como um verdadeiro sistema de alerta precoce diante de mudanças no ambiente. Neste texto, compartilho como observações de campo e estudos sobre biodiversidade, muitas vezes tratados apenas como “dados brutos” da ciência, têm desempenhado um papel essencial na orientação de decisões sustentáveis, tanto na gestão territorial quanto em estratégias empresariais mais alinhadas à natureza.

27/06/2025

Diego Cavalheri

Quando falamos em sustentabilidade, nosso olhar costuma se voltar para temas como emissões de carbono, mudanças climáticas ou energias renováveis. Mas há um elemento menos visível e profundamente revelador, que muitas vezes passa despercebido: a fauna.

A presença ou ausência de determinadas espécies pode revelar mais sobre o equilíbrio de um ecossistema do que imagens de satélite ou indicadores macroeconômicos. Trata-se de uma potência silenciosa, capaz de sinalizar, com precisão, as transformações no ambiente ao nosso redor.

Como pesquisador do Centro de Pesquisas e Inovação Itaqui, com atuação voltada à biodiversidade, frequentemente me deparo com registros de campo que, isoladamente, parecem apenas mais uma anotação entre tantas. No entanto, quando observados em série, esses dados revelam padrões importantes. A redução na ocorrência de anfíbios, por exemplo, pode estar associada a mudanças na umidade do solo; já o aumento de mamíferos generalistas pode sinalizar uma perda de complexidade ecológica. Cada espécie carrega uma história e quando aprendemos a escutá-la, passamos a compreender melhor o ambiente em que ela vive.

Um exemplo marcante no contexto brasileiro vem da Serra do Mar, em áreas de remanescentes florestais do Vale do Ribeira (SP). Nessa região, estudos registraram o desaparecimento local de espécies altamente sensíveis, como o sapinho pingo-de-ouro (Brachycephalus sp.), também encontrado no Distrito Itaqui e a perereca-macaco (Phasmahyla cruzi). Esses anuros, dependentes de microclimas úmidos e estáveis, desapareceram de fragmentos onde houve perda de cobertura vegetal e alterações no regime hídrico, mesmo antes de se observarem mudanças visíveis na paisagem. Os registros, fruto de monitoramentos de longo prazo, subsidiaram ações concretas de restauração ecológica e definição de áreas prioritárias para corredores ecológicos, demonstrando como a fauna pode oferecer alertas precoces valiosos para a gestão ambiental.

Nesse contexto, a biodiversidade deixa de ser apenas uma métrica ambiental, ela se torna uma verdadeira lente de diagnóstico. E isso tem despertado crescente interesse no mundo dos negócios. O reconhecimento do capital natural, a gestão orientada por riscos ecológicos e a adoção de soluções baseadas na natureza exigem uma compreensão profunda da vida

silvestre. Práticas como o mapeamento e o monitoramento da fauna, realizadas, por exemplo, no Distrito Itaqui, são fundamentais para definir prioridades de conservação, mitigar impactos e promover uma relação mais equilibrada entre desenvolvimento econômico e integridade ecológica.

Nem sempre é simples traduzir esses sinais em relatórios ou planilhas. Mas é justamente nesse espaço, entre a floresta e o mundo corporativo, que vejo o futuro das soluções sustentáveis. É ali que pesquisadores, empresas e a sociedade podem se encontrar para construir novas pontes.


Fauna é dado. Fauna é alerta. Fauna é estratégia.